Mulheres LGBTQ+ enfrentam uma série de desafios em relação à saúde mental e ao acesso adequado aos cuidados médicos, de acordo com um novo relatório divulgado pela Urvashi Vaid National LGBTQ+ Women’s Community Survey. O estudo, que analisou as respostas de 5 mil pessoas LGBTQ+ que se identificam ou já se identificaram como mulheres, revelou dados preocupantes, como o fato de 22% das entrevistadas já terem tentado suicídio e 66% terem procurado tratamento para traumas.
Segundo Jaime Grant, pesquisadora que conduziu o levantamento, “a carga de trauma nessa comunidade é enorme”. Essa pesquisa, realizada entre junho de 2021 e junho de 2022, destaca disparidades significativas em relação à saúde mental, doenças e barreiras ao atendimento médico enfrentadas por mulheres LGBTQ+.
Alta incidência de transtornos mentais entre mulheres LGBTQ+
O estudo revelou que as mulheres LGBTQ+ apresentam taxas muito mais altas de transtornos mentais em comparação com a população geral. Quase metade das entrevistadas relatou viver com ansiedade (44%) ou depressão (51%). Para efeito de comparação, a National Association on Mental Illness (NAMI) informa que cerca de 19% dos adultos nos Estados Unidos têm algum tipo de transtorno de ansiedade, e o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) aponta que 18% têm depressão.
Essa diferença é ainda mais acentuada entre as mulheres LGBTQ+ de cor, que apresentaram taxas mais elevadas de deficiência e tentativas de suicídio. Segundo a professora assistente da Ohio State University, Christina Dyar, que estuda disparidades de saúde em comunidades LGBTQ+, “é angustiante ver taxas tão altas de traumas, mas isso é consistente com o que já vimos no passado”.
Barreiras no acesso à saúde
Além das questões de saúde mental, o levantamento também identificou desafios no acesso aos cuidados médicos. Enquanto 77% da população geral dos EUA possui um médico de atenção primária, apenas pouco mais da metade das mulheres LGBTQ+ relataram ter acesso a um. Entre as mulheres LGBTQ+ de cor, a falta de acesso a cuidados de saúde de qualidade foi reportada em números ainda mais elevados, sendo duas vezes mais comum do que entre mulheres brancas.
Os principais motivos citados pelas entrevistadas para evitar ou adiar cuidados médicos foram o custo e a discriminação. Savy Elahian, coordenadora de programa do National LGBTQ Institute of Intimate Partner Violence e responsável pela análise dos dados, destacou que espaços médicos historicamente têm sido inseguros para essas pessoas, especialmente para LGBTQ+ de cor. “Houve experimentação [em pessoas], houve racismo médico”, explica. Isso cria um ambiente de desconfiança que faz com que muitos evitem buscar cuidados preventivos e tratamentos quando necessário.
Outro dado alarmante do relatório é que 14% das entrevistadas nunca realizaram um exame de Papanicolau, e as mulheres LGBTQ+ têm quase o dobro de probabilidade de desenvolver câncer cervical em comparação com a população geral. Um estudo de 2022 mostrou que quase 1 em cada 3 mulheres lésbicas, gays e bissexuais estava com exames de câncer de colo do útero atrasados.
Mudanças institucionais e cuidado comunitário
As autoras do relatório, Grant e Elahian, esperam que esses dados incentivem mudanças no campo médico, não só em consultórios, mas também em políticas públicas. O impacto positivo de pesquisas anteriores é um exemplo de como os dados podem ajudar a transformar o atendimento à saúde. O National Transgender Discrimination Survey de 2011, também liderado por Grant, foi fundamental para melhorar o tratamento de pessoas transgênero, e a expectativa é que esta nova pesquisa traga avanços semelhantes para mulheres LGBTQ+.
O relatório foi transferido para o National Center for Lesbian Rights, uma organização de litígios que pretende usar os resultados para embasar recomendações políticas. Para Imani Rupert-Gordon, presidente do centro, “não podemos advogar plenamente pela nossa comunidade se não soubermos o que está acontecendo nela”.
Além disso, Grant e sua equipe estão empenhadas em garantir que os dados cheguem à própria comunidade LGBTQ+. A ideia é disseminar os resultados por meio de grupos comunitários para que as pessoas possam conhecer melhor o estado atual da saúde dentro de sua própria comunidade e se tornem mais capacitadas a reivindicar seus direitos nos espaços médicos.
A importância da educação comunitária
A acessibilidade dos dados é um aspecto crucial, já que pesquisas acadêmicas sobre disparidades de saúde muitas vezes acabam “presas” atrás de paywalls. Para Dyar, isso é uma frustração constante: “É realmente frustrante quando nossos achados não são divulgados”. A pesquisa comunitária, segundo ela, tende a ser mais acessível e alcançar mais pessoas, promovendo mudanças reais.
Por fim, Elahian destaca a importância do apoio comunitário para ajudar as pessoas a se fortalecerem e a defenderem seus direitos dentro do sistema de saúde. “O apoio da comunidade é mais uma forma de fortalecer esse grupo resiliente”, afirma.
Os dados apresentados pelo Urvashi Vaid National LGBTQ+ Women’s Community Survey revelam uma realidade preocupante para as mulheres LGBTQ+, mas também oferecem a oportunidade de impulsionar mudanças significativas, tanto na saúde mental quanto no acesso a cuidados médicos. Por meio de uma combinação de apoio comunitário e mudanças institucionais, o objetivo é criar um sistema de saúde mais inclusivo e acessível para essa população historicamente marginalizada.
Fonte: LGBTQ+ women face disproportionate rates of mental health issues and barriers to care / NPR
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