Em 2021, o médico canadense Kyle Merritt ganhou destaque internacional ao registrar no prontuário de uma paciente septuagenária, internada por desidratação e agravamento de asma, um diagnóstico incomum: “mudança climática”. A iniciativa trouxe à tona uma questão cada vez mais relevante: como a medicina clínica pode — e deve — responder à crise ambiental.
Clima como questão bioética
O impacto ecológico do aquecimento global afeta o bem-estar e o acesso à saúde, com consequências distribuídas de forma desigual. Populações do Sul Global, pessoas de baixa renda, crianças, doentes crônicos e minorias racializadas são mais vulneráveis, tanto aos problemas de saúde diretos quanto à dificuldade de recuperação após desastres.
Hantel, Marron e Abel afirmam que o ambiente é intimamente conectado à medicina clínica, reforçando que a consciência climática deve integrar a ética médica.
Limites e sobrecarga no campo da ética clínica
Alguns questionam se fenômenos tão amplos como a mudança climática cabem no escopo da ética clínica. Consultores de ética já lidam com questões complexas como racismo, violência armada, trauma, disparidades econômicas e falhas na rede de proteção social. Incluir mais um desafio poderia intensificar a sobrecarga de profissionais frequentemente já esgotados.
Ainda assim, se a ética clínica considera a pessoa em sua totalidade, ela precisa reconhecer os fatores sociais, econômicos e ambientais que afetam a saúde.
Ampliação da perspectiva ética
Há propostas para expandir a atuação da ética clínica. Elizabeth Lanphier e Uchenna Anani sugerem incorporar cuidado informado por trauma para prevenir revitimização. Vo et al. defendem adaptar o modelo de quatro tópicos para lidar com vieses e desigualdades estruturais. Incluir a mudança climática seria mais um passo nesse sentido.
Desafios de viabilidade: o “ought implies can”
Mesmo que haja obrigação moral, resta a dúvida sobre a viabilidade prática — a máxima “dever implica poder”. Barreiras incluem a cultura de individualismo, o contexto político e o modelo médico-industrial orientado ao mercado. A formação médica, centrada no corpo físico, raramente abrange o contexto ambiental.
Caminhos para integração
Mudanças são possíveis com:
- Novas estruturas de decisão clínica que incluam fatores ambientais;
- Políticas hospitalares sustentáveis, como redução de desperdício energético;
- Pesquisa e formação específicas sobre saúde e sustentabilidade.
A consciência climática pode ajudar a repensar questões estruturais, como: até onde a ética clínica deve ir, como sistemas de saúde afetam o cuidado e que ajustes são necessários para atender a esse desafio de justiça.
Fonte: The Climate is Changing. Should Clinical Ethics Change, Too? / The American Journal of Bioethics
Este artigo foi criado em colaboração entre Cláudio Cordovil e Chat GPT-4